Um dos principais problemas causados pelo afundamento do solo em Maceió é o dano psicossocial que tem atingido a diversas famílias que moravam nas áreas afetadas e foram obrigados a deixar suas casas e reconstruir suas vidas em novas áreas de Maceió.
Pensando nisso, a Prefeitura de Maceió resolveu aproveitar o Centro de Acolhimento e Triagem (CAT) do bairro do Pinheiro, inaugurado em maio deste ano, para prestar assistência psicossocial as famílias das áreas afetadas. Equipes da Secretaria Municipal de Assistência Social (Semas), da Defesa Civil de Maceió e da Secretaria Municipal de Saúde se revezam nos atendimentos das vítimas desse desastre.
Uma delas é a dona Josefa Orlando da Conceição. Ela morava na Rua Santa Júlia, no Pinheiro, pertinho do Conjunto Jardim das Acácias, demolido em abril de 2020. Além de morar no bairro, ela trabalhava como auxiliar de serviços gerais num estúdio de pilates que também funcionava no bairro.
Após o problema do afundamento, dona Josefa perdeu o marido, o que acabou interferindo na situação financeira da família. “Eu fiquei praticamente sozinha. Minha filha não trabalhava, ela fazia cabelo, mas assim, uma aqui outro lá, e nós ficamos sem a renda dele, que era aposentado pelo Loas [Lei Orgânica de Assistência Social]”, descreveu.
O acúmulo dessas situações acabou desencadeando um quadro de depressão. “Isso mexeu muito comigo. Perdi 13 quilos, que estou recuperando agora. Como eu falei para psicóloga eu só consigo pensar em morte. Até minha filha já me disse: ‘Mãe, pense em mim, pense no seu neto’. Aí eu vim em busca disso, uma ajuda”, explicou.
Dona Josefa não é a primeira pessoa a buscar a assistência psicossocial no CAT. Desde a inauguração do equipamento 279 atendimentos já foram realizados. Após a triagem, os moradores são encaminhados para os devidos atendimentos, sendo 21 pessoas para o atendimento de saúde mental e cinco encaminhados para a Assistência Social, que também mantém uma equipe atendendo no local.
Para a psicóloga Silma Oliveira, que está atendendo no equipamento, a demanda pode estar represada pela dificuldade das pessoas em reconhecer que o problema que elas enfrentam não trata apenas da questão patrimonial e financeira.
“O discurso consciente é assim: ‘não, eu só quero meu dinheiro, recebendo isso está tudo certo’, mas inconscientemente, até negociar, essa pessoa não dorme, altera o comportamento, começa a beber mais. Se for hipertensa ou diabética há uma descompensa desses quadros. Tudo isso passa a ter uma série de consequências que extrapola a questão patrimonial e financeira”, explica Silma.
Silma descreve que entre as pessoas atendidas há algo que é comum para as mais de 55 mil pessoas que foram atingidas pelo processo de subsidência: a perda de vínculos históricos e sociais com os locais onde moravam.
“Temos depoimentos de pessoas que dizem: ‘meus filhos nasceram e cresceram aqui. Os amigos deles eram os vizinhos. Eles nos deram netos, que viveram aqui’. São vínculos de uma vida que acaba sendo desconstruída e quando as pessoas passam pelos imóveis e veem a situação em que eles estão, aquela situação representa exatamente o que ele sente por dentro. É a história de uma vida inteira. São pessoas que moravam, mas que também sobreviviam do bairro e muitas perderam a história e a sobrevivência”, destaca a psicóloga.
Silma aponta que o processo de mudança, ainda que tenha sido para um local considerado melhor, deixa uma marca profunda nas vidas dessas pessoas. “Nós temos casos que foram para o Aldebaran, aí dizem: ‘ah, mas foi para o Aldebaran’, mas não foi escolha dela. É diferente de vocês querer se mudar com a sua família e planejar essa isso, escolhendo um imóvel. É uma escolha sua, nesses casos não, são casos que causam uma desestrutura emocional”, afirma.
Para a psicóloga os atendimentos realizados no CAT são importantes para manter o vínculo com as vítimas dessas mudanças. Silma explica ainda que esses moradores podem já estar sendo atendidos pelos programas de saúde mental, seja em domicílio, seja nos postos de saúde da rede municipal, mas é necessário um acompanhamento constante.
“Pelas experiências que temos de outros desastres ocorridos no Brasil, sabemos que algumas pessoas são acompanhadas por, no mínimo, cinco anos, mas há casos em que o acompanhamento é necessário pela vida inteira, porque pode acontecer das pessoas desenvolverem transtornos mentais severos”, informa.
A assistente social da Defesa Civil de Maceió, Cristina de Oliveira Albuquerque, ressalta que já há pessoas buscando o apoio psicológico no CAT vindo de cidades da região metropolitana e de outros bairros de Maceió, mas ressalta que, em sua maioria, são ex-moradores das áreas afetadas pelo afundamento do solo.
“Temos pessoas que estão vindo de outros bairros e do interior para buscar esse atendimento aqui no CAT. Ainda temos os moradores das áreas circunvizinhas, que tem imóveis que só começaram a apresentar danos agora e já tem buscado o atendimento aqui. Há muitos relatos de vidas que estão se desestruturando, casais se divorciando, separações de famílias e eles acabam vindo esse apoio para retomar a sua autonomia de vida”, descreve.
Ela explica que os atendimentos no local ocorrem de segunda a sexta-feira pelos agentes da Diretoria Social da Defesa Civil de Maceió. Já o atendimento psicológico ocorre às terças e quintas-feiras. Já o atendimento da Secretaria Municipal de Assistência Social para a inscrição dos moradores dos bairros afetados no Cadastro Único, ocorrem as segundas e quartas-feiras. O horário de atendimento no local é sempre das 9h às 14h.
“Os atendimentos são realizados através da demanda espontânea, ou seja, se chegar e o atendimento que o morador busca estiver acontecendo ele será atendido, e se não for o dia, nós realizaremos a marcação desse atendimento aqui no local. Se o morador preferir ele pode marcar o atendimento através do telefone (82) 3312-5896”, concluiu.
Secom Maceió